segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Coitado do Pinóquio! Que mais irá acontecer-lhe?


O percurso do Pinóquio tem sido marcado por falcatruas menores para singrar na vida e por mentiredo político, desde assinaturas de favor em projectos de casas a la maison com janelas a la fenêtre, ao uso de título profissional que não possui, ao diploma de licenciatura que arranjou com equivalências dadas por professor amigo e com exame feito por fax, por condescendência de um reitor porreiraço, numa altura em que estava assoberbado de trabalho no Governo e não podia dispensar grande atenção aos estudos, até às promessas eleitorais não cumpridas. Mas Pinóquio, desde que é chefe de clã e do Governo, tem mostrado não ser ingrato para os amigos. Só que há os amigos dos amigos, e a filharada, e é muita gente para mamar.

Tentaram envolvê-lo no caso de corrupção do Freeport, porque desbloqueou o que até então alguém bloqueara e à saída do Governo deu luz verde para que o licenciamento pudesse andar. Agora, escutaram-no à conversa com o amigo Vara, outro fura-vidas também diplomado pela conceituada Universidade Independente, que à custa da política e de muita perseverança ascendeu de bancário a banqueiro (banqueiro, salvo seja, que é apenas administrador de Banco), mas que apesar de bem instalado não esqueceu os duros tempos da pobreza transmontana e parece não saber dizer não a uns dez mil por uns telefonemas a correligionários colocados em postos chave para darem uma mãozinha ao negociante das sucatas.

Falava, ao que se diz, sobre modos de limar as garras a media que o têm arranhado envolvendo-o injustificadamente nestas trapalhadas, através de políticas de crédito que o Vara tem capacidade para decidir. Mais uma vez, tratar-se-iam de pequenas falcatruas, agora de política rasteira, que é o tipo dominante da política feita nos bastidores, em privado. Onde, eventualmente, poderia existir indício de qualquer tráfico de influências, ainda que não houvesse pagamento de favores ao amigo do peito, a um justiceiro pareceu caso bem grave e não fez por menos: extraiu certidão por indício de crime de atentado ao estado de direito. Atestado também por juiz de instrução, não apenas por um qualquer magistrado do MP, é coisa séria.

Pelos vistos, andam há que tempos a ver se caçam o Pinóquio em qualquer falcatrua maior. Não parece que nesta empreitada esteja envolvido o PPD, tamanhos são os seus telhados de vidro e o desconchavo que por lá vai em matéria de políticas alternativas. As magistraturas têm múltiplos agentes e não parecem concertadas para o efeito. Restam as lojas clandestinas, regulares ou irregulares, do Oriente ou do Ocidente, todas elas irregulares num estado democrático e de direito, onde muita desta gente se cruza, que se terão fartado do Pinóquio e da sua obstinação em tratar bem uns amigos e não outros. À cautela, tiveram o cuidado de não trazer o melindroso assunto a público antes das eleições, não fosse o diabo tecê-las.

Seja qual for a central apostada neste jogo, a sorte não a tem acompanhado: nem a manhosa personagem se põe a jeito nem os toscos caçadores arranjam a posição certa. Mas é caso para se dizer: coitado do Pinóquio! Que mais lhe irá acontecer?

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Somos todos iguais, mas uns são mais iguais do que outros


A vacina contra a gripe A irá estar disponível de acordo com o plano de fornecimentos da empresa produtora. A vacinação será efectuada por fases e o plano de vacinação está sendo elaborado desde há meses. Foram inquiridas empresas e instituições públicas, que indicaram quem, dos seus quadros de pessoal, deveria ter prioridade. Na primeira fase do plano, que se prevê abranger cerca de 500 000 portugueses, estarão incluídos muitos trabalhadores que ocupam postos de trabalho considerados importantes, assim como os dirigentes partidários.

Tratando-se duma epidemia de fácil contágio, é estranho que o plano de vacinação não tenha sido elaborado considerando prioritários os grupos de risco em relação à difusão da epidemia e, depois, os grupos de risco em relação às consequências da doença para a sua saúde, tendo em conta previsíveis debilidades do seu estado. Dizia o Director-Geral da Saúde que entre os critérios que teriam presidido à elaboração do plano de vacinação contra a gripe A estaria também a importância de algumas pessoas para a vida económica e política do país.

É surpreendente que até em questões de saúde, e em relação a prioridades dum plano público de vacinação, a malfadada economia-política tenha conquistado lugar de destaque. Ficámos a saber de viva voz, afinal, o que todos de há muito suspeitamos: em relação à saúde, não há apenas uns em maior risco do que outros; há também uns mais importantes do que outros. Quando isto é dito com a maior das naturalidades e toda a candura, pouco mais haverá a esperar do espírito crítico desta gente. Está tudo dito: somos todos iguais, mas uns são mais iguais do que outros.